Em 1794, no calor da Revolução Francesa, Saint-Just declarou algo que ainda hoje soa como uma faísca acesa: “A felicidade é uma ideia nova na Europa.” Mais do que uma frase de efeito, era um anúncio de ruptura, uma tentativa de reinvenção da vida.
Que essa ideia ainda entusiasme nossos corações — ainda que em silêncio, ainda que em pedaços — é, por si só, um gesto de resistência.
Cada um de nós, em maior ou menor grau, tenta montar o quebra-cabeça da existência. Procuramos por peças que se encaixem, mesmo quando tudo parece ter vindo de caixas diferentes. Às vezes, encontramos uma forma, uma cor, uma conexão.
E acreditamos — mesmo que por um instante — que descobrimos algo que faz sentido. É nessa aposta íntima, nesse ato de fé cotidiana, que residem as pequenas felicidades.
Tenho convicção de que meu conhecimento sobre a vida é limitado. Sempre haverá alguém melhor, mais preparado, mais talentoso, em qualquer campo que eu deseje explorar. Mas não sinto inveja. Quando amamos o que fazemos, o que é melhor torna-se antes de tudo uma inspiração — não uma ameaça.
A inveja, a comparação constante, a competição disfarçada de ambição... esses são afetos profundamente enraizados na lógica capitalista. São venenos sutis, difundidos como ideais. Se você deseja a vida de alguém apenas porque a viu numa rede social, talvez esteja sendo enganado — ou, quem sabe, apenas ingênuo.
Nada ali é tão real quanto parece. E, o mais importante: onde se perde em atenção, não se compensa em consumo. Viver com verdade, trabalhar com amor, criar com sentido — tudo isso é frágil, incerto e não garante sucesso algum. Mas sem isso, a ideia de felicidade se dissolve.
Não há êxito pessoal que floresça no que é vazio por dentro. Ser feliz não é uma consequência; é uma escolha.
Uma decisão delicada, persistente, às vezes dolorosa — mas que vale a pena. Mesmo entre ruínas, é possível experimentar alegria. Mesmo sem certezas, podemos cultivar alguma esperança.
E talvez seja essa esperança — difusa, tímida, rebelde — que nos empurre para o que realmente importa: nos organizar, juntos, para incendiar a realidade que, dia após dia, ainda queremos transformar.